VIGÍLIA SOLIDÁRIA...
Pensei que estava a sonhar. Era meia noite no relógio de parede ao fundo da cozinha e meio da noite no meu relógio biológico, mas eu ia jurar que tinha ouvido o canto de um pássaro na fiteira (cordyline australis) do meu quintal...
Por momentos, pairou a dúvida na minha mente, dúvida ampliada pelo decúbito dorsal em que me tinha deixado cochilar no sofá da saleta de serviço anexa à cozinha (hoje transformada em enfermaria de recurso para a minha Lara, a Grand Danoir de quem gosto muito que está a recuperar de uma nefrectomia). Tínhamos ido a votos para ver quem ficaria de vela durante a noite, mas perante as reticências dos outros dois presumíveis voluntários, decidi por exclusão de partes dar eu o passo em frente que se impunha e oferecer o corpo ao manifesto...
Mas não havia a mínima dúvida: destacando-se do ressonar da Lara, agora mais calma sob o efeito da medicação pós operatória e do crepitar da fogueira na salamandra ao lado da televisão onde acabava de ter início o jornal da meia noite (com a palavra "mudo" no canto superior direito do écran...) ouviam-se agora nitidamente os dotes canoros de um passarito que eu já me habituei a ver por aí durante o dia. Talvez a intensidade excessiva da luz pública na rua em frente, o tenha induzido em erro, fazendo-lhe crer que já era dia... Mas não, ainda faltam algumas horas - de cantoria para ele e de dores lombares para mim, que não sou capaz de acertar com uma posição minimamente confortável!