VALONGO DOS CIDADÃOS (*) - CONSTRUIR O FUTURO...
É uma frase aparentemente inócua – toda a gente de uma forma ou outra, com mais ou menos empenho e mais ou menos criatividade, se empenha nessa construção – mas a força com que todos se envolvem nessa construção tem muitas razões subjacentes que a podem condicionar - porque construir é uma abstracção que, no limite, pode apenas significar ‘evoluir’ no status quo.
É inquestionável – e toda a gente perceberá a analogia – que o futuro dos valonguenses tem sido construído mais ou menos na base de “mandar pôr meias solas numas botas velhas” – e que, previsivelmente, acabarão mais cedo do que o acrescento.
O Projecto ‘Valongo dos Cidadãos’, tal como a génese do próprio nome permite perceber, encarna uma ideia de futuro que se distancia não apenas do passado mais ou menos próximo, mas sobretudo do presente demasiado próximo desse passado do qual nunca se distanciou suficientemente.
Por aqui, no terreno que Valongo dos Cidadãos percorre com muita confiança e cada vez mais apoios, não acreditamos em iluminados, intelectuais do poder local, fazedores solitários, decisores únicos, governantes inquestionáveis, autores e executores de um dado projecto cuja utilidade ninguém foi chamado a comentar e menos ainda a validar, porque os ‘grandes líderes’ foram sempre pessoas muito ‘sabedoras’ - ou omniscientes que é quase a mesma coisa - e quando assim é (claro que não é!) os servos só têm que aceitar e agradecer as decisões que os intelectuais do sistema, neste caso o poder local, têm achado por bem tomar em nome deles.
Da forma como entendemos que deve ser o exercício concreto do Poder Local, construir o futuro, dito de uma forma simplista e mais entendível, pode ser comparado à tarefa do escultor ou, na arte sacra, do santeiro que pegam num fragmento de rocha, num volume metálico, na raiz ou no tronco de uma árvore e com base em ‘projetos’ mentais e raramente em linhas desenhadas no papel, dão corpo à sua visão criativa.
Mas, independentemente da beleza plástica imediata das obras executadas ou da sua valia prática à luz das necessidades ou preferências do homem médio actual, tudo pode ser condicionado pela durabilidade intrínseca das mesmas, pela sua resistência à erosão dos tempos, ou pelas expectativas de utilidade no futuro que se perspectiva de uma determinada maneira.
A oxidação de uma estátua construída em bronze é geralmente considerada uma mais-valia – às vezes até é acelerada de forma artificial - mas já não é assim em peças idênticas construídas em ferro e muito menos se essas peças visam uma utilidade prática no nosso dia a dia.
A beleza estética ou a sua utilidade inicial até podem ser idênticas ou muito parecidas, mas o seu horizonte futuro será sempre muito diferente e muito mais limitado – muito mais próximo do acto criativo que lhes deu vida.
O projecto do grande colectivo ‘Valongo dos Cidadãos’ foi apenas a semente que lançamos à terra fértil, mas que integramos e dinamizamos apenas numa perspectiva de partilha de ideias com o cidadão anónimo ou concreto – porque os valonguenses são gente ‘que sabe do que fala’ e está cada vez mais cansada de ser dirigida e condicionada por figuras providenciais e omniscientes – ou que assim mesmas se consideram, na sua imensa e onanista prosápia...
Para este já imenso colectivo, construir o futuro nunca será uma obra acabada porque o significado do termo ‘futuro’ muda em cada dia, em cada hora, em cada minuto, como em cada dia, hora ou minutos teremos novas adesões, novos apoios.
Para nós, o que verdadeiramente importa é que as ligações temporais relevantes do mesmo com o presente e com o quase passado do minuto anterior não se mantenham ou se quebrem ‘só porque sim’, mas sempre por razões de interesse público - das pessoas concretas e definidas e que assim sejam entendidas por elas.
Como escreveu o grande Poeta de todos nós cuja memória celebraremos daqui a dois dias com a habitual pompa e circunstância,
(...) Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem, se algum houve, as saudades (...).
Por nós, tudo faremos para que as mágoas não façam parte da memória futura da nossa passagem pelo exercício cívico do Poder Local em Valongo. E também nenhum de nós faz questão de deixar nenhuma marca pessoal da sua passagem pela ‘cadeira do poder’ – nenhum edifício, nenhum arranjo paisagístico, nenhuma estrutura metálica a embelezar um qualquer largo ou praça – porque as marcas, connosco, serão sempre gizadas de forma colectiva, consensual de preferência, e o poder será sempre – e a marca também – do povo que em cada momento tenha sido chamado a decidir.